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  • Santana do Ipanema, 30/09/2024
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Marcelo Ricardo Almeida

"JOÃO URSO", NA ESCOLA

Na rua de lampiões apagados, o contista da loucura abriga este João Urso com tardias correntes literárias europeias com o formão do Barroco (1580) e as tintas do Parnasianismo (1882).


Edição do livro João Urso, do escritor Breno Accioly

Em Alagoas, a língua é falada com alado sabor de açúcar. Quando cai o sol sobre as lagoas: adormece Alagoas, acorda Alagoas. Não deixa escapar as rédeas da história. Salve! Salve! Alagoas salve! Salve! É o lugar onde o sol nunca se apaga, aterrissa sobre as águas verdes, azuladas. Extática beleza de Alagoas rica, que realizou sonhos de dormir Império, acordar República. Onde as palmeiras sussurram: Em Alagoas... a vida é boa. Alagoas de cores mutantes, verão o ano inteiro, Alagoas mar bigâmico de Mundaú e Mangaba.

Entre os gêneros literários, o conto destaca-se desde a origem dos tempos com temas peculiares. A peculiaridade está presente no contista da loucura na rua dos lampiões apagados.

Mesmo longe do Formalismo com os seus estudos da linguagem poética que precede ao Estruturalismo com as suas abordagens em áreas distintas adaptadas na leitura trazida à estrutura da obra literária e, finalmente, o devir que respira o Pós-Estruturalismo com a sua análise plural do texto literário. Apresenta Breno Accioly (1921-66) na galeria ficcional personagem João Urso. Barroco e Parnasianismo estão presentes em Breno Accioly.

Se dedução resulta das certezas interpretativas do próprio raciocínio lógico, indução colhe casos que se assemelham e chega-se a uma certeza. Esta certeza da presença do estilo literário de Breno unindo mundos literários distintos/distantes encontra-se em “João Urso”.

Ele é resultado da região e suas variações diatópicas, históricas e sociais, portanto diastráticas, nas quais está inserido o sertão. Esta geografia é berço da galeria ficcional onde são agasalhadas as personagens das quais se destaca a sua personagem-matriz (João Urso) de mãos pequenas e olhos espremidos por bochechas gordas no universo descomunal da cabeça que enxerga Santana por uma das janelas, no sobrado defronte a igreja da padroeira do município.

Na rua de lampiões apagados, o contista da loucura abriga este João Urso com tardias correntes literárias europeias com o formão do Barroco (1580) e as tintas do Parnasianismo (1882). Contando a tragédia da infância num misto de Barroco e Parnasianismo.

Barroco caracteriza-se com a estilística retórica alimentada por antítese, vive a mistura de opostos. Possui caráter de pedra irregular. Luz, sombra, tensionamento entre teocêntrico/antropocêntrico, presença de solidão e agonia. O mundo barroco é representado por água, relâmpagos, nuvens, morte.

Busca-se rebuscar a sua escrita e abusa-se do paradoxo com esta e outras figuras de pensamento, a exemplo da ironia, hipérbole e gradação; estes são os recursos fonológicos que, valorizando os sons, oferecem relevo fônico à criação literária. Parnasianismo está representado principalmente em sonetos.

Caracteriza esta corrente pela busca de perfeição formal. Uma criação literária parnasiana é detalhista e ambienta a criação ficcional com descritivismo. Há presença da arte como sinônimo de beleza.

Usa a figura de construção (polissíndeto) e intensifica o discurso com repetições. O espaço onde as personagens transitam apresenta-se com a força das artes plásticas.

Soneto é esta forma fixa de poesia: Silêncio/Os livros/Dormem/Agora//Entre as................/Gôndolas/na  estante/Silêncio//Deixa/O livro/Dormir//Seu sono/De livro/Silêncio.

O soneto em “João Urso” não está de corpo e encontra-se de alma. Personificado em seu suplício ao ter que o decorar como forma de castigo sobre um tamborete.

Autor de “João Urso” colhe no barroco visões divergentes entre o sagrado e o profano, a loucura e a sanidade. Exagera segundo regras estéticas barrocas.

Faz a sua própria tinta com as misturas complexas de sentimentos, de figuras, rebusca a linguagem ao gosto da crise pós-Renascimento, nega a simplicidade da renascença.

É hiperbólico, metafórico. Em sua tela, há exagero nas gargalhadas de João Urso causando a morte da equilibrista no circo mambembe que aparece em Santana.

No segundo estilo – talvez legado inconsciente nas lições de sua professora Zefinha? – ressurge a velha linguagem rebuscada, detalhes no espaço de personagens. Cientificismo e alienação social presentes nos espaços de João Urso.

Na filologia das serras. Onde as pedras dormiam. Surgiram trovões senis. Fugiram de relâmpagos. Angústias represadas. Em terços e ave-marias. Era o próprio João Urso. Se repetindo em sonetos. Em pé em um tamborete. Ali, olhando a palmatória. Presa às mãos da mãe. Viajava no rito de castigo. João Urso gargalhando. Gargalhadas terríveis. Estremecendo Santana. E eram tantas e repetidas. Por elas caiu e morreu. Uma equilibrista do circo.

Lê-se no gênero textual narrativo curto que apresenta Santana ao mundo literário: aquelas gargalhadas em João Urso vêm como explosões incontroláveis – sem a presença simultânea do choro – como se identifica no Coringa dos gibis, que sofre de Síndrome Pseudobulbar.

Este cientificismo que demarca o território, em João Urso, fracassa; a capacidade da Ciência não o devolve a Santana livre daquele riso provocador que evolui a gritos apavorantes e loucas gargalhadas.

Considerando a qualidade do contista de Santana, a Educação Básica ao ler “João Urso” consegue aproximar o aluno dos contos “João Urso” (EPASA, 1944). Estreia do santanense no Rio de Janeiro com as suas narrativas ambientadas no sertão.

Marcello Ricardo Almeida é o autor do conto premiado "Quem gaba a esposa é o marido", de 1999, e do livro de nanocontos “O dente cariado de MonaLisa”.



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